Dr. Alberto Timm

 Uma leitura superficial das genealogias bíblicas pode deixar o leitor com a  impressão de serem elas partes irrelevantes e enfadonhas inseridas ao texto sagrado. Mas estando comprometidos com “toda palavra que procede da boca de Deus” (Mt 4:4), não poderemos considerar insignificantes tais partes da Bíblia. A tradicional aversão às genealogias pode ser superada pela compreensão da sua importância, das suas características básicas e das lições espirituais que podem ser delas extraídas. A despeito de nem sempre serem completas, as genealogias bíblicas são relevantes. Elas fornecem informações fundamentais para se calcular a idade aproximada da raça humana, bem como para se datar alguns eventos bíblicos com seus respectivos protagonistas. Duas genealogias (ver Mt 1:1-17; Lc 3:23-38) comprovam que Jesus de Nazaré é descendente de Abraão (Gl 3:16) pela linhagem de Davi (Mt 22:42; At 2:29-31; Rm 1:3; 2Tm 2:8). Considerando-se a genealogia de Cristo provida em Mateus 1:1-17, percebe-se uma lista numericamente simétrica, com três blocos de catorze nomes cada (v. 17), mas com a supressão de pelo menos quatro nomes – o verso 8 não menciona os reis Acazias, Joás e Amazias, que reinaram depois de Jeorão (e não Jorão) e antes de Uzias (cf. 2Cr 22:1; 23:11; 24:1, 27; 25:1; 26:1), e o verso 11 deixa fora o nome de Jeoaquim, filho de Josias e pai de Jeconias (cf. 1Cr 3:15, 16). Por outro lado, na mesma genealogia encontramos alusões a quatro mulheres: Tamar, Raabe, Rute e Bate-Seba, as quais, com exceção de Rute, tiveram um passado moralmente questionável (ver Gn 38; Js 2; 2Sm 11). Tais alusões podem ser entendidas como evidências concretas de que Jesus não veio “chamar justos e sim pecadores [ao arrependimento]” (Mt 9:13). A genealogia de Cristo, em Mateus 1:1-17, avança progressivamente de Abraão até “José, marido de Maria” (v. 16), seguindo a linhagem do rei Salomão, filho de Davi com Bate-Seba (v. 6; 1Cr 3:5). Por sua vez, a genealogia em Lucas 3:23-38 retrocede de José até “Adão, filho de Deus” (v. 38), passando por Natã, outro filho de Davi com a mesma mulher (v. 31; 1Cr 3:5), razão pela qual muitos dos nomes mencionados entre José e Davi não aparecem em qualquer outra parte da Bíblia. Retrocedendo até Adão, Lucas procura mostrar que Jesus é o Salvador, não apenas dos judeus, mas de toda a humanidade, como está evidente na alusão de Simeão à salvação manifesta a “todos os povos: luz para a revelação dos gentios, e para a glória do Teu povo de Israel” (Lc 2:30-32). Alguns críticos questionam a confiabilidade da genealogia pré-diluviana (ver Gn 5), sob a alegação de conter lacunas semelhantes às encontradas em Mateus 1:1-17. Mas essa alegação acaba desconhecendo as diferenças estruturais entre ambas as genealogias. Em Mateus, encontramos uma relação retilínea de nomes interligados pela expressão “gerou”, que pode significar um descendente imediato (filho) ou um descendente um pouco mais distante (neto, bisneto, etc.). Mas, no livro do Gênesis, a genealogia pré diluviana é enunciada de forma a não dar espaço a lacunas. É dito que alguém viveu determinado número de anos, gerou um filho, e viveu mais certo número de anos, e morreu. Por sua vez, aquele filho seguiu o mesmo processo. Portanto, não há possibilidade de lacunas como no caso de Mateus.

Além disso, das genealogias bíblicas podemos extrair importantes lições existenciais e espirituais. Elas nos ensinam, por exemplo, que a vida neste mundo não é eterna, e que as pessoas morrem com diferentes idades. Por conseguinte, não sabemos quando nossa própria vida chegará ao fim. Mas, por outro lado, as genealogias confirmam que, a despeito de todas as doenças e calamidades, Deus ainda preserva, por Sua misericórdia, a existência humana. Nas sucessões de nomes sempre aparece um descendente, e assim a vida continua até hoje. Portanto, uma leitura mais detida das genealogias bíblicas pode fortalecer nossa própria vida espiritual.


Fonte: Revista do Ancião (julho – setembro de 2008)